Os gêmeos

Marcus estava deitado na cadeira de sua avó materna quando pensou sobre o que faria quando não pudesse mais contar com as pessoas que sempre o apoiavam, tinha medo de não conseguir resolver seus problemas sozinho. Por instantes, teve consideração por sua família que sempre o deixou se defender por seus erros, especialmente por sua avó que o levava para passear e lhe dava dinheiro escondido.

O momento de reflexão acabou quando de súbito sua irmã entrou no quarto e lhe disse:

- Que está fazendo aqui quieto? Vamos jantar agora, desça antes que mamãe fique nervosa. - A preocupação da irmã com a falsa moralidade da mãe impregnava todas suas sentenças, e isso irritava Marcus.

- Estou indo. - respondeu secamente.

Mas Amélia, a impaciente irmã, não moveu sequer o olhar que o fitava com reprovação. Ela o esperava com os braços cruzados, como se se fosse um agente carcerário. A irmã era o paradoxo da vida de Marcus. Ele sentia que devia amá-la em respeito a linda infância que desfrutaram junto e ao mesmo tempo a odiava pela pessoa mesquinha e fraca em frente aos próprios desejos que havia se tornado. Não conseguia suportar o fato de não conseguir mais achar o lindo sorriso de felicidade no rosto dela. Ela mudara, ele também. Mas ele acreditava que ela havia se tornado uma pessoa sem sonhos próprios, alguém que almejava o nada.

Irritado, Marcus repetiu as mesmas palavras.

Qualquer pessoa naquele momento entenderia que Marcus gostaria de ficar sozinho. Mas Amélia, a irmã que tinha tomava as vontades da mãe para si, não entendeu ou optou por não demonstrar entendimento.

Um suspiro pesado e demorado saiu da boca de Amélia. Foi neste momento que Marcus levantou subitamente da cama da avó e partiu em direção de Amélia e a empurou duas vezes. Mas ela não saiu do quarto. Empurrou-a pela terceira vez, mas ela resistiu.

Os dois pararam de se mexer. Os olhos se fitavam com raiva. Era claro ambos nutriam um um ódio recíproco e Amélia fazia questão de deixar isso claro com suas insistência por saber que chateavam o irmão, que estava de férias da faculdade. Por outro lado, Marcus apenas sentia pena da irmã, que não sabia viver senão debaixo das vontades da mãe e decidira não ir para faculdade.

Marcus a beijou no rosto.

Amélia passou a mão no rosto.

E depois disso ambos desceram um atrás do outro pela enorme escada que fica logo à direita da porta do quarto da avó. A mesma escada que os dois costumavam brincar quando crianças e agora eram o cenário envolvido pelo ódio.

Marcus tropeçou.

Amélia não tentou segurá-lo.

Do outro lado de cá

Como era a vida vista de fora?
Ele não sabia pois vivia imbricado em sua interioridade. Essa o levava a crer que sua vida valia mais que qualquer suspiro.
Tão fraco e exposto, mal sabia como era mal visto pelo fora.
Usava do desejo para ser algo novo, brincava com as palavras para não ficar só e fazia sempre o mesmo trajeto para buscar o que foi perdido. Nada aprendia, só respirava.
Achava que enxergava mas so driblava seus sonhos.

Apenas uma conversa

Foi um suspiro que deu início aquela noite sem fim. As palavras começaram meio que sem interresse, sendo o corriqueiro o principal ator naquele momento. Eram duas pessoas normais que conversavam de seus problemas. E seus problemas eram aquilo que as aproximava.

A pauta era óbvia: relacionamentos. Com pouca idade e muitos sonhos, esse tema acaba por permear sempre inúmeras conversas. É uma fala o que se acha, e um que senti o que não viveu. Mas é bom, em meio as pérolas, sempre tem uma que brilha.

Foram horas que se passaram, e as mais diferentes visões sobre um mesmo fato emergiram como se fossem resoluções únicas e inéditas. A conversam fluía de forma agradável e com uma espontaneidade harmônica.

Passadas cinco horas, ficou claro que deveriam descansar. A sobriedade já havia os deixado há muito tempo e a empolgação era inversa à necessidade acordar.

Estavam sorrindo. Eles não haviam resolvido nenhum de seus problemas, mas estavam mais leves, pois o compartilhamento do inatingível gera sempre uma amenização da frustração.

Conversaram sobre desejos toda a noite, mesmo sem saber disso.

_Boa noite! Foi muito bom conversar com você.

_Boa dia! Durma bem.

Pequeno longo caminho

Era devagar o modo que caminhava e seus olhos fitavam o chão sujo e impregnado com toda sua tristeza. O jovem voltava de um incidente causado por sua falta de malícia e astúcia. Este fato positivista figurava com clareza em sua mente, o que lhe causava ainda maior vontade de esquecer o inesquecível.

_Nossa! Não tinha percebido. Mas eu quero mesmo é sua amizade. Você sabe que te adoro, né?

E a imagem projetada de alguém que nunca existiu escorreu tão rápida como as lágrimas em seu esguio e pálido rosto. Depois disto, preferiu retirar-se com prontas e educadas palavras e lutou contra todo seu organismo para não cair de joelhos e encenar alguma cena romântica de qualidade duvidosa.

Ao virar-se pensou em olhar pela última vez nos olhos, nunca tentativa quase insana de achar um tesouro que de tão raro não existia.

Já no seu caminho de volta e com a emoção já mais calma, as lágrimas solitárias e lentas surgiam e caíam em seu rosto que já estava vermelho e seu pensamento desconexo.

Se fosse pertinente acusar um vilão esse seria o pensamento. Foi ele que criou situações tão claras que se tornaram reais. Foi esta realidade que deu força para o suposto ato de libertação. Pobre rapaz, a verdade no amor só funciona positivamente em histórias escritas, já dizia alguém que vivia de ócio televisivo. De tanto sonhar começou a amar e por achar que amava, resolveu abdicar.

Sem saber realmente o que poderia fazer para livrar-se do incômodo de estar sofrendo, encheu sua mente de um turbilhão de idéias que buscavam, incessantemente, palavras ou atos que pudessem reverter a situação. Ele indagava-se sobre a possibilidade da existência das palavras corretas. Essas seriam aquelas que se ditas num momento preciso, com a entonação adequada e no lugar conspícuo fariam com que a pessoa sentir-se o que você almeja dela.

E mais uma vez ele tornava-se vítima de seu assimétrico pensamento e as imagens que esse elaborava.

Assim seguia o moço pela calçada que não estava mais tão escura apesar de seus passos ainda lhe causarem dor. Algumas vezes, também, os contornos arquitetônicos da rua se alteravam. Obviamente ele achava aquilo estranho, mas não concedeu a importância devida, pois não tinha concentração suficiente para nutrir tal sensação.

Ao chegar a casa foi direto para seu quarto e resolveu descansar. Já estava convencendo-se de que tinha sido benéfico o vaporoso termino. Mesmo com o coração acelerado e regando uma plantinha de amargura que já se misturava com um pouco de ódio, viu que poderia encontrar outra pessoa daqui um tempo. Engraçado como, hoje em dia, a catequização deste sentimento selvagem começa logo depois de alguns quarteirões.

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